Os namorados pobres
flores murchas
à namorada
e a namorada come as flores
porque tem fome
Não trocam cartas
nem retratos nem anéis
porque são pobres
Mas um dia
têm muito medo
de se esquecerem
um do outro
então apanham
um cordel
do chão
cortam o cordel
com os dentes
e trocam alianças
feitas de cordel
Não podem
combinar encontros
porque não têm
número de telefone
nem morada
assim encontram-se
por acaso
e têm medo
de não se voltarem
a encontrar
O acaso
não os favorece
Decidem nunca sair
do mesmo sítio
e ficarem sempre juntos
para não se perderem
um do outro
Procuram um sítio
mas todos os sítios
têm dono
ou mudam de nome
Então retiram
dos dedos
os anéis de cordel
atam um anel
ao outro
e enforcam-se
Mas a namorada
tem de esperar
pelo namorado
porque o cordel
só dá para um
de cada vez
O namorado
descansa à sombra
da figueira
e a namorada
baloiça
na figueira
O dono da figueira
zanga-se
com os namorados pobres
porque julga
que estão a roubar figos
e a andar de baloiço
Adília Lopes
Shirin

Aqui fica o link para a entrevista com Abbas Kiarostami:
Paraíso
Hoje falou-se destes beijos censurados do Cinema Paraíso. Fantástico encontrá-los acompanhados de uma das minhas músicas favoritas do Chico Buarque.
Na morte da avó
não bastasse a humilhação pública de morrer
espera-se do corpo que cumpra com indiscutível
pompa o intolerável protocolo de ausentar-se
a penosa execução circular e nocturna do velório
a presença inconveniente dos agentes funerários
os adereços lutuosos a obscena maquilhagem
no dia seguinte, o inventário das orações, a concisa
cerimónia (não há muito a dizer, sejamos honestos
e soa até a insulto que se pronuncie o nome de
Lázaro) o caixão é fechado, o dia põe-se bonito
– é quase tão imoral como alguém ter trazido uma
gravata com motivos facetos, uma camisa florida –
depois, em casa, parece que as vozes ressoam como numa
sala a que tivessem subtraído os móveis e houvesse, por isso
a estranheza de uma extensão desprovida, dissemelhante
o avô vai buscar as memórias da infância (por que
razão obscura omite ele as lembranças de casado?) há
na sua voz qualquer coisa de paciente melancolia
como se aceitasse, com constrangedora submissão, que
o tempo não se detenha nunca, que os anos nos empurrem
para um buraco na terra, nos sujeitem a tão bruta descortesia
a prontidão da morte, a ligeireza do tempo, a estupidez
da vida que nunca vai encontrar cura e razão para ela própria
contra tudo isso eu alardeio o poema, antecipo a derrota
Miguel Manso, in Santo Subito
A vez de Berlim...
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Sou a sombra da opressão, um grito colado à parede. Sonho ser a sombra de um pássaro quando se liberta de uma gaiola. Ser aquele que lhe dup...
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