O namorado dá
flores murchas
à namorada
e a namorada come as flores
porque tem fome
Não trocam cartas
nem retratos nem anéis
porque são pobres
Mas um dia
têm muito medo
de se esquecerem
um do outro
então apanham
um cordel
do chão
cortam o cordel
com os dentes
e trocam alianças
feitas de cordel
Não podem
combinar encontros
porque não têm
número de telefone
nem morada
assim encontram-se
por acaso
e têm medo
de não se voltarem
a encontrar
O acaso
não os favorece
Decidem nunca sair
do mesmo sítio
e ficarem sempre juntos
para não se perderem
um do outro
Procuram um sítio
mas todos os sítios
têm dono
ou mudam de nome
Então retiram
dos dedos
os anéis de cordel
atam um anel
ao outro
e enforcam-se
Mas a namorada
tem de esperar
pelo namorado
porque o cordel
só dá para um
de cada vez
O namorado
descansa à sombra
da figueira
e a namorada
baloiça
na figueira
O dono da figueira
zanga-se
com os namorados pobres
porque julga
que estão a roubar figos
e a andar de baloiço
Adília Lopes
Shirin
O filme não é uma hora e meia de espectadores a verem outros. O filme é o tempo de imaginarmos visualmente uma história na nossa cabeça. Ela é construída visualmente nas nossas cabeças através do que nos é sugerido pela narração e pelos olhos daquelas mulheres. Antes de termos um filme em que temos tudo feito e só precisamos "engolir", temos um filme em que participamos de forma activa e em que necessitamos estar completamente absorvidos para não nos perdermos. Existe um filme diferente para cada espectador e existe um filme diferente para cada mulher que aparece no filme, pois o que elas exprimem são emoções acerca de algo porque passaram na vida...não têm um filme à sua frente como parece, têm um "filme" nas sua cabeça. Tantos filmes podemos imaginar dentro de um só filme...Quantos é que nos permitem tal? Para além disto tudo, o poema é óptimo. Para mim, valeu a pena. Para quem não entrar na lógica do filme e aceitar o "jogo", deve ser realmente uma valente seca.
Aqui fica o link para a entrevista com Abbas Kiarostami:
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